segunda-feira, 14/05/2018
O mestrado integrado em Medicina da Escola de Medicina da Universidade do Minho está a atravessar um processo de reforma curricular. Iniciada em maio de 2017, a reestruturação parte de uma “motivação intrínseca” dos docentes e alunos da Escola, tendo por base a medicina do futuro.
O diretor do curso, João
Cerqueira, assume o entusiasmo de encabeçar um movimento pioneiro no panorama
nacional, mas relembra “o peso da responsabilidade” que essa tarefa acarreta. “A
ideia de fazer uma reforma curricular parte do princípio de que o ambiente em
que os nossos graduados daqui a uns anos vão trabalhar vai ser diferente
daquele para o qual estamos agora a prepará-los”, explica João Cerqueira. Deste
modo, a reestruturação em curso pretende adaptar o currículo “para que o
graduado tenha um perfil adequado à medicina do futuro”.
O processo está
dividido em três fases, estando a sua implementação prevista para o ano letivo
2020-2021. A primeira fase, que terminou em setembro de 2017, consistiu na
auscultação de pessoas e entidades ligadas à prática da medicina, para que se
pronunciassem sobre qual deveria ser o perfil dos graduados em medicina daqui a
10-15 anos. A segunda fase está a decorrer até finais de maio de 2018 e
pretende enumerar as formas de responder às necessidades identificadas pelos
agentes envolvidos no processo. Para isso foram formados vários grupos de
trabalho com vários atores que vão “apontar linhas de atuação”. O docente da
Escola de Medicina explica que “cada grupo de trabalho tem uma missão específica
na sua área e as áreas são muito variadas”. A terceira fase implica a
reorganização do currículo, para que depois “se possa submeter as propostas de
alteração às autoridades competentes”.
João Cerqueira
afirma que “o resultado desejável” desta reforma seria que os alunos saíssem da
Escola de Medicina “a corresponder ao perfil que foi identificado como sendo
aquele que vai ser necessário para exercer medicina em 2030 ou 2050”. E que
perfil é esse? “Inclui que eles sejam dotados de um excelente raciocínio clínico,
que sejam altamente motivados e empenhados na aprendizagem médica contínua, que
tenham um grande perfil humanista e uma base científica sólida”, sintetiza o
docente. Tudo isto sem esquecer a tecnologia, da qual devem ser conhecedores. João
Cerqueira prossegue: “A estas cinco características de perfil associam-se
também outras características que nós queremos que o próprio processo final de
chegar a esta decisão tenha”. São elas a flexibilidade do currículo, “que proporcione
um elevado grau de motivação aos alunos, e que permita também que alunos com
diferentes perfis tenham percursos diferentes”.
Ainda em relação à
tecnologia, a Escola de Medicina pretende “pôr um ecógrafo nas mãos de cada
aluno”. João Cerqueira explica que, de facto, “se o estetoscópio foi uma
revelação quando apareceu, hoje em dia há muito pouca informação útil que se
consegue retirar de um estetoscópio”. Assim, e embora o ecógrafo não substitua
o estetoscópio, há muitos cenários em que a ecografia à cabeceira do doente
(feita por não-imagiologistas) é “fundamental”.
“Esta medicina
não está a funcionar”
“Eu acho que a
medicina do futuro vai ser diferente porque claramente esta medicina não está a
funcionar”, considera João Cerqueira. Na opinião do médico, “a maior parte dos
serviços de saúde está organizada de forma errada”, em função de resultados que
são números, “o que funciona muito bem quando estamos a falar de produzir
meias”. E critica: “Claramente não funciona bem quando estamos a falar de
doentes nem de doenças. E o que é preciso verdadeiramente é transformar aquilo
que são os indicadores de resultados em saúde de uma cultura de produção de
números para uma cultura de ganhos em saúde”.
Este é um dos
objetivos da reforma curricular, através de uma clara aposta nas capacidades de
comunicação clínica e no humanismo dos futuros médicos. “O que nós não
precisamos é de ter médicos-robots
nem médicos atrás do computador. Nós precisamos de ter médicos que falam cara a
cara com as pessoas”, diz João Cerqueira. Esta componente de formação estará
bem presente ao longo do curso e, na opinião do docente, precisa de ser
desenvolvida. Porque “daqui a 30 anos o que vai diferenciar os bons dos maus
profissionais é a capacidade de comunicar”.